Faleceu um homem que dedicou toda a sua vida em prol do bem-estar dos outros

jose2É sempre difícil escrever sobre a partida daqueles que admiramos e estimamos. José Martinho da Conceição Alves – o Zé Martinho da Igreja Nova – partiu aos 80 anos tendo falecido onde sempre sonhou – no Lar da Igreja Nova – do qual foi o iniciador e mentor, no seu modesto quarto, que escolheu para o fim da sua vida e a sua cerimonia fúnebre teve a presença dos presidentes das juntas do concelho, da câmara, bombeiros de Ferreira e centenas e centenas de amigos, que no discurso fúnebre lido por um dos seus amigos de longa data, José Manuel Duarte, na sede da Associação Igrejanovense, tocou a todos, e todos se despediram com uma grande salva de palmas de obrigado ao homem, ao lutador, que pautou quase toda a sua vida pelo associativismo, pela inovação, pelo bem estar dos Igrejanovenses.
Deixou uma obra social ímpar, um jornal “Despertar do Zêzere” e alguns postos de trabalho criados. Foi autarca (presidente de junta da Igreja Nova) mas a sua real vocação era a luta por conquistar algo que fosse útil a todos.
Conheci este homem há 35 anos quando, no Templário publicava mensalmente uma página da sua freguesia. Sabendo da força da comunicação e da necessidade da palavra escrita, comprou uma tipografia em Tomar e editou o “Despertar do Zêzere”, na data mensário, hoje quinzenário, e que é o único jornal do concelho de Ferreira do Zêzere de forma a informar e denunciar o que estava mal no seu concelho e na qualidade de fundador foi jornalista, angariador de assinantes, passando este a ser o jornal da Associação Igrejanovense, uma associação que tinha ajudado a criar no tempo da “outra senhora” ainda não se falava em associativismo e que pela sua grandeza (4 pisos) fazia jus aos construtores civis da freguesia e era e ainda é uma obra ímpar na região. O pouco tempo que lhe sobrava da sua actividade de construtor civil era dedicado à associação e ao jornal e com prejuízos de toda a ordem pessoal, a associação e o jornal estavam para ele acima de tudo, mais que a família. Contagiava os colaboradores, era exigente e com a quarta classe e o curso universitário da vida, aspirava sempre mais. A Associação Igrejanovense de Melhoramentos fazia jus ao nome e a freguesia teve uma rede pública de água, décadas antes da água ao domicílio.
Pensava nos mais velhos, via a desertificação, o problema da velhice e cria dentro da associação a vertente social do centro de dia. O edifício nasceu e lembro-me de na hora da sua inauguração não ter gostado que os outros membros da direcção tenham escolhido o nome de S. Martinho, uma homenagem mais que justa. Lembro-me de no dia da inauguração, perante o governo civil e então secretário de Estado da Segurança Social – Rui Cunha, ter sido confrontado pela feitura ilegal de uns quartos, aproveitando o último piso do edifício. Sem papas na língua responde ao secretário de Estado que o seu povo precisava de ajuda dia e noite e que o centro de dia, só por centro de dia não fazia sentido e o que ali estava era fruto da ajuda dos seus conterrâneos. Foi o primeiro centro de dia que já fazia a vertente de lar. Sabendo que o lar é que fazia falta, ao fim de uns anos e agora dedicado a ele e a sua esposa a esta causa, apresenta o projecto de ampliação do edifício. Hoje o Lar de S. Martinho é uma das grandes obras de lar e centro de dia, um “hotel de cinco estrelas” a nível de quartos e que presta apoio a tantos utentes e emprega mais de 30 pessoas. Sua esposa já não assiste a esta nova obra. Para ele em vez de escolher um dos modernos quartos, escolhe um dos quartos mais simples, na parte velha, aqueles que fez à revelia das exigências da lei e que catapultaram o primitivo edifício para o complexo que hoje existe. Foi aí que estive com o amigo Zé Martinho por altura em que o rancho de Alviobeira ali foi cantar os reis. No seu quarto, anexo um mini-escritório com todas as encadernações do seu jornal e muitos livros. Lia muito e ia escrevendo. A saúde e a idade tiravam-lhe as forças. Foi ali que terminou os seus dias, na casa que construiu – como sempre sonhou. Avesso a burocracias, lutava e ia até ao fim, para conseguir as suas obras. Pensou sempre mais nos outros do que nele. Haverá poucos homens assim! Perdeu-se uma grande escola. Sua vida daria um grande livro, mas não gostava de elogios. O que fez para ele era a ordem natural das coisas, o dever de cada um contribuir para o engrandecimento da terra, estava-lhe no ADN, sem pretensões de ordem financeira. Os Igrejanovenses jamais vão esquecer este homem, um grande homem, cujo lar e a sua obra a todos orgulha.
Obrigado Zé Martinho.
Paz à sua alma!
in Cidade de Tomar, António Freitas